Governo Lula vê indefinição no Congresso que pode abreviar atuação de Pimenta no RS

Aliados do presidente admitem reservadamente que operação foi arriscada e deu munição política para deputados e senadores

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Brasília

A criação de um ministério extraordinário no Rio Grande do Sul por meio da edição de uma medida provisória colocou o governo Lula (PT) em um cenário de indefinição que pode abreviar a permanência do ministro Paulo Pimenta no estado.

Parte do governo admite, reservadamente, que a operação foi arriscada e calcula agora o custo político para manter o cargo de Pimenta.

Paulo Pimenta visita abrigo em São Leopoldo (RS), pouco antes de ser nomeado ministro extraordinário de Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul - Pedro Ladeira - 15.mai.2024/Folhapress

Como as medidas provisórias têm até quatro meses de validade, a manutenção do ministério até fevereiro de 2025, como anunciado, depende obrigatoriamente da votação do texto. Assim, o ato deu munição política para o Congresso, na avaliação de governistas.

Se não for aprovada pelo Congresso, a secretaria extraordinária será extinta em 25 de setembro, a menos de duas semanas das eleições municipais. Aliados admitem que há, no entanto, um cenário ainda pior: a votação da MP antes de setembro e com derrota para o governo.

Diante das incertezas, o próprio Pimenta já vem reconhecendo publicamente que pode ficar no Rio Grande do Sul de quatro a seis meses, em vez de dez.

"Eu quero [ficar no estado] de quatro a seis meses, ter todo o processo de convênios firmados entre todas as áreas de atuação do governo federal concluídos. E, a partir disso, cada um dos ministérios acompanha a execução", disse o ministro em entrevista à Folha.

Um dos aliados de Lula alertou para o risco de derrota na votação da medida provisória e sugeriu um dispositivo legal que dispensasse o aval do Congresso —como um decreto do presidente da República.

Auxiliares técnicos afirmaram que a edição de um decreto só seria possível se não houvesse a criação do ministério extraordinário. Sem um órgão com atribuições específicas, porém, Pimenta ficaria no Rio Grande do Sul apenas como ministro-chefe da Secretaria de Comunicação, sem poder assumir as funções pretendidas pelo governo.

Interlocutores apontam que a decisão de criar um ministério foi tomada pelo presidente Lula em conjunto com Pimenta, sem uma consulta mais ampla dentro do governo e no Parlamento. Por isso nem todos os articuladores políticos, tanto no Palácio do Planalto como no Congresso Nacional, chegaram a apresentar os cenários ao mandatário.

A medida provisória que cria o ministério foi assinada por Lula na semana passada, durante viagem a São Leopoldo (RS). O objetivo do novo cargo é coordenar as ações federais de enfrentamento à calamidade, em articulação com os governos municipais e estadual.

A criação do cargo com a escolha de Pimenta, porém, obrigou o governo federal a lidar com acusações de politização da tragédia. O ex-ministro da Secom (Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República) tem sua base eleitoral no Rio Grande do Sul e frequentemente é apontado como pré-candidato ao Palácio Piratini.

Aliados de Lula afirmam, por outro lado, que o governo se viu obrigado a colocar um nome de peso no estado para marcar posição diante da postura do governador Eduardo Leite (PSDB) e da falta de reconhecimento público de medidas importantes, como a suspensão da dívida gaúcha com a União.

Integrantes do governo têm avaliado que o foco de resistência maior vem do Senado, onde bolsonaristas fazem duras críticas ao ministro por ter acionado a Polícia Federal para combater notícias falsas em torno da tragédia gaúcha.

Na semana passada, o senador Cleitinho (Republicanos-MG), um dos alvos do pedido de investigação do governo, disse que estava "engasgado" com Pimenta e que gostaria de enfrentá-lo no Senado.

"Eu estava doido, Paulo Pimenta, para poder convocá-lo aqui ao Senado para olhar na sua cara, para você falar que eu fiz fake news. Eu queria muito essa oportunidade porque quem não deve não teme. Porque eu não sou mentiroso não, rapaz", disse Cleitinho.

Durante a sessão, o próprio presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse que a advocacia da Casa ajudaria Cleitinho a se defender das acusações: "Estamos muito convencidos de que vossa excelência não praticou ilícito algum na abordagem que fez em relação a esse tema".

Coube ao líder do PT, senador Beto Faro (PA), sair em defesa de Pimenta. Uma das poucas manifestações de apoio veio da também petista Teresa Leitão (PE).

"A nomeação do companheiro Paulo Pimenta, que acompanhará de perto todas as ações de nosso governo em prol dessa reconstrução que será preciso no estado gaúcho, é uma demonstração ao mundo de que estamos todos unidos, pensando somente na ajuda àquele povo", disse o líder.

Na terça-feira (21), o senador Ciro Nogueira (PI), presidente do PP, voltou a ironizar a escolha de Pimenta nas redes sociais ao compartilhar uma notícia de que a chuva também preocupa o estado de Santa Catarina.

"Vaga de Emprego: procura-se alguém da companheirada para ser Ministro da Reconstrução de Santa Catarina. Motivo: enchente no estado. Prêmio: projetar-se para as eleições. Trabalho: dar entrevista. Não é necessário cuidar do povo."

Governistas, sobretudo na Câmara dos Deputados, minimizam o risco de derrota e reforçam que todas as medidas importantes enviadas ao Parlamento acabaram aprovadas —como a medida provisória que reorganizou a Esplanada dos Ministérios.

O texto foi aprovado pelo Congresso em junho do ano passado a poucas horas do fim do prazo. Se perdesse a validade, Lula deveria retomar o desenho de Jair Bolsonaro (PL), com 23 pastas em vez de 37. Com o ministério extraordinário, o número chegará a 39.

Colaboraram Julia Chaib e Cátia Seabra, de Brasília

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